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08 maio, 2014

O "meu" tio João coxo.



Ao entrar no blog do meu amigo Alexandre de Castro, encontrei por lá uma bruxa ( aqui ) que me fez lembrar este episódio, que agora partilho. Tive até a ousadia de lhe roubar a bruxa,  que bem podia ser a minha.

Um dia, uma amiga, pediu-me que eu a acompanhasse a Portalegre a uma consulta, que eu deduzi automaticamente que fosse uma consulta médica. Acedi ao pedido e lá fomos as duas de autocarro, de Elvas a Portalegre. Quando chegámos, apanhámos um táxi e a minha amiga entregou ao taxista um pedaço de papel com a morada, que o homem imediatamente reconheceu.

- Vai ver a Dona C.? É a primeira vez?
-Não, não! Já sou sua doente há três anos.
- Ela é fantástica. Tem curado muita gente!

Este pequeno diálogo, entre a minha amiga e o taxista, deixou-me curiosa. Sempre achei esta minha amiga muito saudável, nunca lhe conheci uma única dor de cabeça e fiquei a matutar que doença teria ela, para andar a ser tratada já há três anos. Como nunca fui de fazer muitas perguntas, fiquei calada, pensando que em breve iria saber, uma vez que ela me tinha pedido que entrasse com ela, naquilo que eu achava que seria um consultório médico. 

O taxista deixou-nos à porta de um prédio, não recordo com quantos andares, mas recordo que o elevador nos deixou no 4°. Tocámos à campainha e um senhor, com os seus 50 anos, abriu-nos a porta. Foi ao entrar que comecei a duvidar daquela consulta. Na entrada, uma consola exibia fotografias familiares: uma avó com os netos no parque; uma rapariga à beira mar; um bebé com umas belas bochechas, sentado num cadeirão. As fotografias não deixaram de aparecer ao longo do corredor, por onde estávamos a ser conduzidas. Chegámos a uma sala comum, um arco na parede, separava a área de jantar da de estar, onde pelos menos umas oito pessoas, espalhadas entre as duas áreas, aguardavam a sua vez. Não vi um único livro ou revista, mas chamou-me a atenção, a quantidade de peças de estanho que decoravam os móveis de castanheira. O senhor apontando para duas cadeiras, disse baixinho - Sentem-se, quando a Dona C. abrir a porta ela irá escolher quem vai ver primeiro.

Ali ficámos sentadas uma boa meia hora, no meio de um silêncio desconfortável, que ninguém ousava quebrar. De repente, comecei a ouvir gemidos, provenientes da sala ao lado - a que tinha a porta fechada, de onde era suposto aparecer a "médica". Quanto mais alto se ouviam os gemidos, menos eu percebia se seriam de aflição, ou de alguém a ter um orgasmo. Apeteceu-me levantar e deixar a minha amiga pendurada. Foi com muito esforço que resisti ao impulso e fiquei ali, quietinha, a ver como muitos dos presentes se benziam! E eu só pensava, "onde é que eu me vim meter?". De repente, um grito, arrepiou-me dos pés até à nuca, e, logo de seguida, voltou a fazer-se silêncio. Trinta segundos depois a porta abriu-se. Dela saiu uma quarentona, bonita, bem vestida, apesar de a ter achado um pouco despenteada, e logo atrás, a "médica". A quarentona desfez-se em agradecimentos, chegando mesmo a beijar as mãos à "médica"! E lá saiu, acompanhada pelo mesmo senhor que nos abriu a porta. A Dona C. deitou um olhar rápido à sala e de repente fixou-se em mim.

- Que olhos tão bonitos! Vem.
Eu muito atrapalhada, respondi imediatamente.
- Não, não! Eu só vim acompanhar a minha amiga.
- Então entrem as duas, tu também precisas.

"Mau mau, Maria!" pensei, "querem lá ver que acabam de me arranjar uma doença!". Muito contra a minha vontade, lá entrei. E a Dona C. decidiu que eu seria "tratada" primeiro. Assim que me apanhou sentada numa cadeira, colocou-me uma mão na testa, não sei se a direita se a esquerda, só sei que usava a outra para a sacudir energicamente à minha volta, enquanto murmurava não sei o quê, porque eu não a percebia, e me despenteava toda. Cá estava a explicação do penteado da quarentona. Eu, mesmo sem achar graça nenhuma àquele teatro todo, comecei a ficar presa à cadeira. Mas mesmo colada! E mais colada fiquei, quando ela começa a falar, como que em transe.

- Estou a vê-lo! Ele está a falar comigo. Espera...não o consigo perceber...espera...ele não te quer fazer mal...mas quando te mudaste para a casa nova, ele foi contigo... José...não...João! É o teu tio João. Um tio já afastado...morreu há muitos anos...estou a vê-lo...tem uma deficiência...é coxo! Sabes quem é?

Eu, que havia ficado sem pio, só consegui abanar a cabeça, para lhe dizer que não. E ela lá continuou, sempre agarrada à minha cabeça, agora já com as duas mãos.

- Estou a vê-lo bem agora, está a vir até mim, a coxear... tens que o ajudar a seguir.

Largou-me a cabeça, lavou as mãos, secou-as numa toalha branca e escreveu num papel uma reza, que eu devia dizer em todas as divisões da minha casa nova, enquanto as benzia com sal grosso. Supostamente, isso iria expulsar o espírito do meu "tio falecido" e deixaria de ouvir os ruídos que sempre ouvia à noite. E eu que achava que era a Nuxa, a gata, que à noite se entretinha, a atirar ao chão, os pequenos electrodomésticos da cozinha! Depois foi "tratar" a minha amiga, que por ser já bem conhecida, teve muito mais assunto para "tratar". No final daquilo tudo, a minha amiga pagou-lhe e lá saímos as duas, todas descabeladas. No regresso a Elvas, nenhuma das duas pronunciou uma única palavra. Escusado será dizer, que nunca mais a acompanhei a consulta nenhuma.

Aquele episódio não me saía da cabeça. Havia ali muita coisa que eu não estava a conseguir explicar. Logo eu, que sempre gostei de chegar ao fundo de todas as explicações. Nesse fim de semana, fui visitar a minha mãe. Como quem "não quer a coisa", comecei a indagar, sobre um possível tio que tivesse morrido coxo. Mais estranho ficou tudo, quando descobri um tio que se chamava João, que morrera há mais de 20 anos. O único que a minha mãe não se lembrava, era que fosse coxo.

Passei a semana toda a ouvir ruídos em casa. Era de dia, era de noite, já tudo me parecia o "João coxo" aos saltinhos.  As portas que se fechavam, já não eram correntes de ar, eram o João, todo lixado comigo, porque eu ainda não tinha benzido a casa, e o homem que era coxo, precisava de ajuda para seguir o seu caminho. Os ruídos no telhado eram o que mais confusão me fazia. Pareciam patas, que eu logo imaginei serem as unhas do dito cujo, que já deviam estar bem grandes, a raspar no sótão do prédio. O meu andar era o último. E como raio é que a "bruxa" soube que eu me havia mudado para uma casa nova?

Por aquela altura, eu gostava muito de bordar em ponto de cruz. 
Certa noite, estava eu e a gata, sozinhas em casa.  Sentei-me a bordar num cadeirão, onde eu mais gostava de o fazer, colocado estrategicamente por baixo do candeeiro da sala, para o efeito. Já estava a bordar há uns bons 20 minutos, com a gata enroscada às pernas, quando de repente me começam a cair gotas de água em cima do bordado. Juro que pensei, "Porra! o João coxo já chora!". Fiquei com medo de olhar para cima, não fosse dar de caras com o coxo a chorar, agarrado ao candeeiro. Ali estava eu, sem tirar os olhos das mãos, a ouvir a chuva a cair lá fora, gelada no cadeirão, com medo de olhar para cima. Foi precisamente o olhar para as mãos, que me acendeu uma luz no cérebro, que nos últimos dias, não andava a funcionar muito bem. Uma das minhas mãos, exibia uma aliança. Com a cara de "menina" que eu ainda tinha na altura (22 anos), qualquer pessoa deduziria que eu seria uma recém casada, daí a mudança para a "casa nova"...olhei imediatamente para cima e comecei a rir à gargalhada, ao ponto de assustar a gata. Levantei-me e fui bater à porta da minha vizinha da frente, que tratava do condomínio do prédio, para a informar que me chovia na sala. No dia seguinte, descobrimos que algumas telhas fora do lugar, deixaram entrar a chuva e uns quantos pombos no sótão (olha aqui as patinhas, que já eram unhas!), mandou-se arranjar o telhado, e, o "tio João", que pela vulgaridade do nome, vivo ou morto, na minha terra quase todos têm um, lá seguiu o seu caminho.


Sónia M 

Se o Passos Coelho descobre esta economia paralela...
É que fica caro, muito caro, ir a estes sítios despentear o cabelo!

22 abril, 2014

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As minhas mãos  agarram
{quase mortas}
o gemido da noite que cobre ainda as árvores.

A cada fruto que arrancam sem ruído
é como uma promessa de noite escura.

Por mais que as folhas lhe gritem as suas preces
o sol não toca este pedaço de chão.

Alguém acendeu uma fogueira no caminho
para enganar o sangue e a sede dos sonhos.

Sentada 
junto ao sítio onde 
{ferozmente}
lhe empurram para longe o destino
uma menina
pergunta ao primeiro pássaro que acorda
quando foi que morreram as fadas.


Sónia M


(Imagem retirada da net, sem autor mencionado)

26 março, 2014

Será que as paredes também choram?

Eram quase oito da noite e as temperaturas ainda rondavam os 40°C. 
O céu tinha o azul da manhã e o sol queimava na pele como se fosse meio dia. Mas o Alentejo é assim no verão, talvez seja isso que faz a vida ali parecer mais lenta. Cerca de um quilómetro antes de entrar nas muralhas da cidade, decidimos à ultima da hora visitar um local, que apesar daquela ser a "nossa" cidade, jamais havíamos pisado. Subimos por uma estrada estreita, ao chegar ao fim da estrada a vista que tínhamos era fantástica. Dava a sensação que dali se podia ver o mundo inteiro. Não trazíamos connosco nenhuma máquina fotográfica, mas a necessidade de gravar o que víamos em mais algum lugar, que não fosse apenas a memória, fez-nos usar os telemóveis. Apesar da qualidade das imagens não ser a melhor, hoje quero partilhá-las convosco. 

Podíamos ver nitidamente alguns bairros periféricos à cidade, o castelo, e, no centro desta primeira foto, aquele que é considerado o maior aqueduto da península Ibérica, o Aqueduto da Amoreira. Tem 8,5 quilómetros de extensão, 843 arcos com mais de 5 arcadas e torres que se elevam a 31 metros de altura. Foi construído com o intuito de trazer a água desde os arrabaldes, no local da Amoreira, até ao centro da cidade. Uma vez que o poço que abastecia a cidade, desde a época da ocupação árabe, se tornou insuficiente, devido ao aumento da população. Foi em 1537 que João III de Portugal, designou o arquitecto Francisco de Arruda para executar o projecto, mas só em 1620, correram pelo aqueduto, as primeiras águas dentro dos muros da cidade. O Aqueduto da Amoreira, está classificado como Monumento Nacional desde 1910. E  integra o sítio denominado Cidade Fronteiriça e de Guarnição de Elvas e as suas Fortificações, classificado pela UNESCO como Património Mundial desde 2012.


Pisamos agora, um dos pontos mais altos da região, sendo portanto, um local de grande importância estratégica. Estamos às portas do Forte de Nossa Senhora da Graça (Alentejo, Elvas, Portugal).


Como se pode ver, as portas estão abertas. E qualquer um se pode passear, por este local carregado de História. Foi daqui que o exército espanhol atacou severamente a cidade durante o cerco de Elvas (1658-1659), na Guerra da Restauração, quando na altura o único que aqui havia era uma capela em homenagem à Nossa Senhora da Graça. Situação que se repete em 1762, durante a Guerra dos Sete Anos, quando Elvas foi novamente sitiada. É então que D. José I, determina que seja aqui construída uma fortaleza que permita completar o circuito defensivo da cidade, encarregando o Marechal Wilhelm von Schaumburg-Lippe (nome pelo qual ficou durante muito tempo conhecido - Forte de Lippe)  do seu planeamento e da defesa do reino. Terão trabalhado na construção deste forte, entre 1763 e 1792 (ano em que ficou concluído),  3 a 4 mil homens.  O forte resistiu ao ataque das tropas espanholas durante a Guerra das Laranjas (1801) e ao bombardeamento infligido pelas tropas francesas do general Soult, Guerra Peninsular (1811). No passado foi usado pelo exército português como prisão militar. Recentemente conheci um senhor,  aqui nas ruas de Antuérpia, que nele cumpriu a sua pena, partilhando comigo algumas memórias mais caricatas que tem do local. O mundo é pequeno...

O Forte de Nossa Senhora da Graça integra o sítio denominado Cidade Fronteiriça e de Guarnição de Elvas e as suas Fortificações, classificado pela UNESCO como Património Mundial desde 2012.
                                                     





O interior é um labirinto, uma verdadeira obra prima da arquitectura militar europeia do século XVIII, infelizmente as imagens mostram bem as condições em que se encontra, muito próximo da ruína...

E eu, que já sei do abandono às pessoas e lhe conheço as lágrimas, no fim da visita não deixava de me perguntar - Será que as paredes também choram?














"Não há conquistas ou ambições a satisfazer, mas há o grande dever de conservar o que nos resta da herança do mar."





"A Pátria é uma herança sagrada que devemos transmitir intacta aos nossos descendentes."









Nota:
À data desta publicação, consegui apurar junto a um funcionário da Câmara Municipal de Elvas, que a Câmara adquiriu os prédios militares da cidade e que neste momento, se encontra a decorrer um concurso, para adjudicação da empreitada para a obra de recuperação.

Mas a vida no Alentejo, tal como acima mencionei, corre, corre e corre, a passo de tartaruga...

Sónia M

05 março, 2014

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- Não, nada tem a ver com isso. Nem sei se o que te explico algum dia poderás entender. O que se passa é nada mais que uma questão de gosto. E o que eu gosto mesmo, é das paredes caiadas de branco, bicadas pelo sol. As ruas são como corredores iluminados, toda aquela luz chega a cegar-te. Sempre que as toco, há pássaros que me nascem dos dedos e correm a fazer ninho nas oliveiras. Sabes que ali os olhos não te fazem falta, mas o nariz sim. Imagina que és assaltado no caminho por uma vizinha da vizinha, que é amiga da vizinha da tua mãe. Agarra-se a ti como se não houvesse amanhã e diz-te - Ah gaiata, estás cá? Entra, entra, acabei de fazer uma açorda e o Ti Joquim está a pôr a mesa no quintal. - Mesmo de olhos fechados tu vais, porque o nariz te diz que deves ir. Não fazes ideia da festa que se consegue fazer com meio quilo de pão duro. Não é preciso muito nem pouco, aquele tudo é quanto basta. É como te digo, é uma questão de gosto. E a felicidade tem gostos simples.

Sónia M

(Imagem retirada da net)

18 fevereiro, 2014

Só o Tempo é leve...




Tenho terra no sangue e uma cidade verde no peito. 
Guardo olhares nas mãos que os olhos não sabem ver. 
Hoje encontrei uma memória junto ao dedo mindinho, 
é tua e minha. Afagavas-me os cabelos e sorrias, 
cheiravas a terra, a tangerinas e a tabaco. 
"És tão pequena", dizias, "que o mundo não te encontra". 
E os teus olhos gritavam, "És tão grande!".  Vê como é 
leve o Tempo: é um sonho. Onde um mar nos empresta um 
barco, um pássaro nos cede uma asa, para as sucessivas 
viagens que por ele fazemos. Chego, como quem sai do 
sonho e o espelho diz-me que as minhas mãos já cresceram 
e que os meus passos têm o tamanho dos teus. Talvez agora 
já te possa dizer, que somos nós que encontramos o mundo 
e que ele é pequeno, acredita. É tão pequeno que nos cabe 
inteiro nos ossos. E às vezes pesa, o mundo, a memória 
e o corpo. Pesa tanto. É preciso vasculhar entre os dedos, 
até encontrar o cheiro da tangerina e da terra,  para que tudo 
pareça de novo leve, como o Tempo: uma miragem que o espelho desfaz.

Sónia M


Na imagem 
o meu pai e um dos seus bisnetos.

25 agosto, 2013

Aquela tarde




Ainda sonhava na tarde,

com a doçura dos dias idos,
quando os teus olhos 
me olharam, tristes e fundos.

Olhando as paredes de cal,
caminhámos lentamente,
a calçada da rua espelhava,
o martírio do teu rosto triste.

A boca fechada,
um silêncio medonho,
ia a alma já rasgada
do pesadelo dentro do sonho.

E a tarde ia caindo
e nós caíamos com a tarde.
O fim daquela rua, no dobrar
daquela esquina, um novelo de saudade.

Ali deixei a alma,
parti sem mais demoras.
E agora grita a noite
- Não tens alma, porque choras?

Quando as trevas se abatem,
sobre esta cidade deserta,
há um ninho de monstros,
que em silêncio me desperta.

Sónia M

(Aos meus pais)

23 outubro, 2012

O bolo de noz da gaiata



Ela era apenas uma gaiata, 
no tempo em que ainda se podia brincar na rua.
Todos os dias no caminho para a escola, encontrava o Sr. Joaquim e a D. Amélia 
à porta de casa, sentados numa daquelas cadeiras de verga, que o próprio 
Sr. Joaquim continuava ainda a fazer, apesar da sua avançada idade.
Quase todos os dias a gaiata lhes trazia o pão. Às vezes as compras da mercearia. 
Era sempre recompensada com uma deliciosa fatia de bolo.
-Toma lá gaiata! Estás tão magrinha! Ainda deve estar quentinho.
Ela gostava deles. Eram sempre doces, simpáticos, faziam tudo juntos. 
Mas o que ela mais gostava, era de subir a rua em direção à escola, 
mastigando aquele bolo com pedaços de noz!
Um dia, ao chegar perto da casa, deu de caras com uma ambulância parada na porta.
A porta aberta como sempre, mas as cadeiras vazias... 
Lá de dentro tiraram a D. Amélia, deitada numa maca e enfiaram-na na ambulância...já ia morta.
O Sr. Joaquim tapava o rosto com as mãos e chorava, chorava muito! 
Dizia baixinho o nome dela, uma...e outra vez. 
Ficou assim, parado no meio da rua, como se olhasse para a sua vida 
a desaparecer na curva. - Amélia, o que vou eu fazer sem ti...
Devagar, dirigiu-se para a porta, mas parou, como se não conseguisse entrar. 
Até que se deixou cair na cadeira...
Ali estava ele, como sempre, sentado à porta de sua casa!
A gaiata continuava parada na esquina, como se estivesse colada ao chão. 
De repente, reparou que ainda trazia o saco do pão e dirigiu-se ao Sr. Joaquim. 
A casa já não cheirava a lavanda, como todos os dias, um perfume que se espalhava
 logo pela manhã, por quase toda a rua.
Ele permanecia sentado, cabeça baixa, com as mãos no rosto molhado.
Estendeu-lhe o saco. Ele levantou a cabeça, olhou-a e balbuciou 
- Hoje...não tens bolo, gaiata...
Virou costas e correu rua acima, como uma doida, sem reparar que também ela chorava.A partir daquele dia, sempre que ali passava, olhava a porta fechada, sem as cadeiras...sem vida.
Mentalmente dizia-lhes bom dia...até que um dia...deixou de o fazer!

Sónia M

Porque a história sempre se repete....
À Ti Violante