Não sei o que me falta ainda dizer-te,
ou se aquilo que digo, o digo vezes que
cheguem.
Estes últimos anos tem sido tudo à
míngua.
As palavras, as idas à horta, para
colher a alface fresquinha,
as risadas à mesa, as sobremesas da
mãe, os abraços...
Ai os abraços!...(e eu que estou tão
longe...)
Faltas-me. Faltas-me sempre.
Uns dias mais que outros.
Hoje o sangue gritava mais alto e o
peito apertava,
por não te ter, ali ao virar da
esquina.
Estava frio, mais que ontem. Estes dias
são sempre mais frios.
Voltei a apanhar-me a rezar ao Tempo.
Não a Deus, mas ao Tempo.
Não ao tempo, que faz, mas ao Tempo
que tenho.
É a ele que elevo as minhas preces.
Peço mais tempo, para mais palavras,
mais idas à horta, mais risadas à
mesa, mais sobremesas da mãe, mais abraços...
ainda que tudo à mingua... (e eu que
estou tão longe...)
Aprendi contigo, que nós não passamos
pelos dias,
são os dias que passam por nós. Que o
dia deve passar inteiro,
e nós devemos permanecer de pé. É
isso que realmente conta,
estar ainda de pé, depois do dia
passar. Agarrar-se ao que seja, mas ficar firme, direito!
“Enquanto eu for vivo, não cais”,
dizias (e sei que ainda dizes).
Hoje agarrei-me à nossa última
memória juntos,
quando num gesto apressado me
estendeste a mão, mais uma vez,
e a apertaste com força.
Enquanto te
escrevo, ainda sinto a tua mão na minha,
a tentar desfazer esta maldita distância.
Agora que o dia já passou, quero que saibas, Pai, que passou por nós de mãos dadas...
Sónia M