Não sei se é a folha que procura a árvore,
ou a árvore que procura ainda a folha...
Há buscas que nunca encontram caminhos...
Caminhos que ninguém procura. Sonhos que ninguém persegue...
Estações com comboios que vão e vêm de lugar nenhum.
Partidas sem regresso e regressos a apeadeiros vazios.
Braços que ninguém espera e abraços que ninguém esperava...
Dias que não chegam e amores que nunca o serão.
Janelas voltam a fechar-se e abrem-se portas.
Praças enchem-se de gente e mais gente. Tanta gente,
de novo tão invisível no outro. Da janela, todos os dias,
avistava uma mulher, com um chapéu na cabeça de uma cor indecifrável.
Reconhecia-lhe o andar cambaleante, de quem vai bêbada de saudade
e amarguras. Sem a janela...sem a janela já não a encontro!
Não sei se morreu ou voltou à transparência da rua.
Mas nada disto importa!
Mais ao longe, o verde de uma oliveira
resiste estoicamente à paisagem alaranjada.
Mesmo que eu não queira, o sol já inundou os campos e as esplanadas,
onde umas mãos te rodeiam agora o pescoço...
e um homem de sorriso amarelo, tenta vender, por entre as mesas,
a solidão da rosa em pranto, pela falta de raiz.
A um canto da esplanada ali está ela! Uma mesa vazia.
Que talvez, por distração ou respeito, ninguém quis ocupar.
Talvez me espere ... e ali te escreva mais um verso que ninguém lê.
Mas eu sei, eu sei...que nada disto importa!
Muito ao longe, no firmamento, céu e mar fazem-se uno,
sem deixar o mínimo rastro deste lugar, onde comungam o amor e o ódio;
o céu e o inferno; a mulher do chapéu de cor indecifrável e um dia que não chega;
um comboio sem paragem e tu e eu.
Tudo isto sem rastro.
Tudo isto sem nós...
©Sónia Micaelo
(Texto e imagem)
No vídeo
com voz ⤵️
Lindo texto Sónia. Como é teu apanágio... E deliciar quem lê.
ResponderEliminarUm pouco triste. Creio que é triste porque, estranhamente, quando se diz que "nada disto importa" a verdade vai um pouco mais além... Uma coisa que não importa, não merece tantas palavras, não importa.
Gostei muito. As metáforas são tuas amigas. Vivem em ti.
E vê, até o "céu e o mar fazem-se uno", sem deixar rasto.
Beijinho e bom fds.
Boa noite, Sónia M.
ResponderEliminarAos meus olhos traças o poema numa metáfora ao tempo e às circunstâncias em que todos estamos mergulhados. O eu e outro, o eu e o tu, a rua e o vácuo da transparência, a geografia da presença e da ausência, o somatório que se espelha em subtrações, enfim, um mundo de paradoxos.
Gostei e agradeço a visita à minha janela.
Beijo.
grata (re)descoberta a tua poesia!
ResponderEliminara vida passa indiferente, lá fora, sem um aceno, eu sei!...
apesar de tudo, gostei de ver uma insignificante folha
a erguer-se, do chão, frondosa árvore...
abraço
Olá, Sónia!
ResponderEliminarUm excelente poema, onde vemos a vida, tal como ela é e acontece.
Senta-te na mesa vazia, que há muito te espera, pega numa rosa, esquecida, talvez, e encontra-te na escrita. Aí, tu e ele darão as mãos, assim, inconsequentemente.
Beijos e bom resto de domingo.
Lindíssima prosa poética,gostei imenso,tudo perfeito por aqui!! Desejo-te um excelente mês de Julho,muita alegria,muita paz,muita saúde para ti,fica bem,muitos beijinhos!!
ResponderEliminarO de volta é o único caminho para o que buscamos.
ResponderEliminarGK
Há impérios que morreram por cansaço
ResponderEliminaroutros por desamor
e ainda há aqueles
que morreram sem saberem
que tudo o que nasce,
um dia, a tantos de tal, irá morrer…
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Destaco o comentário do Agostinho, que foi quem melhor interpretou o poema da Sónia Micaelo.
Sónia,
ResponderEliminarTodos somos folhas de uma árvore e nem sempre o pressentimos. A árvore da vida!
Porém há dias em que nos movimentamos como espectros tocados pela brisa...
Beijos!
Há buscas que nunca encontram caminhos...
ResponderEliminarEsta frase resume de modo sublime
muito do que penso...
Abraço, Sônia...
Se calhar todos somos folhas que procuramos a nossa árvore. Por vezes os caminhos são ingratos e difíceis mas não será nessa ingratidão e dificuldade que está a beleza do caminhar?
ResponderEliminarGostei muito do seu poema. Sem rimas, é muito difícil de escrever. Elogio a inspiração e criatividade poética
Voltarei
Cumprimentos poéticos.
A vida é uma roleta, mas ainda bem que só uma vez é que é russa...
ResponderEliminarAté lá, deixemos os nossos rastros, que valham a pena serem admirados por quem gosta de nós realmente.
Excelente, gostei muito.
Bom fim de semana, querida amiga Sónia.
Abraço.
Leio, interiorizo, fico quedo, como uma qualquer personagem do poema...
ResponderEliminarMas reajo, quero vida. E oxalá uma réstia desta vontade se propague até à janela de quem observa.
Um beijinho, Sónia :)
Maravilhoso texto e um severo convite a reflexão.
ResponderEliminarBoa tarde Sónia,
ResponderEliminarUm poema muito belo.
A vida com suas vicissitudes, onde somos tudo e nada, em que o vazio e as dúvidas se instalam e nos questionamos sobre tudo.
Precisamos manter viva a esperança.
Um grande beijinho.
Ailime
Boa tarde tudo bem? Sou brasileiro, carioca e procuro novos seguidores para o meu blog. E seguirei o seu com prazer. Novos amigos também são bem vindos, não importa a distância.
ResponderEliminarhttps://viagenspelobrasilerio.blogspot.com/?m=1
Boa tarde Sônia. Obrigado por me seguir. Estou lhe seguindo também. Bom final de semana.
ResponderEliminarInexplicáveis ou, até, necessários desencontros, cobrindo lugares, pessoas, expectativas. Belíssimos versos. Bjs.
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