10 janeiro, 2016

O SILÊNCIO

No dia em que emudeceste a cidade
um sonho atormentou-me a noite

havia uma margem
onde uma frondosa árvore
em desespero
tentava abraçar o vento

e o vento passava e ria 
intocável

um pássaro trazia a manhã à janela de um rio 
onde tu banhavas o verbo
- ventre do poema
mais secreto e indomável 

e a vida, meu bem
esse fogo
tão bendito quanto maldito
ia secando todas as águas...

trouxeste o tempo para dar de beber aos peixes
- esse quase nada onde quase tudo assenta - 
e um muro de espelhos ergueu-se!

ao olhar o meu reflexo no muro
arranquei os olhos
para não voltar a ver-me

eu era o germe do silêncio
que chorava versos mudos
condenado a roer a memória mais funda
até que o verbo... já não doa.

Sónia M




9 comentários:

  1. gosto de poemas assim
    que vão ao fundo do Verbo
    e estilhaçam todos os sentidos...

    beijo

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  2. E o verbo era o Ser. Ser amado que é razão de vida no dizer da poeta. A contradição do amor bem expressa em "esse fogo tão bendito como maldito".
    Muito bem encadeadas as palavras; soltas no ritmo certo para que o fôlego fique em bom sossego.
    Boa semana, Sónia

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  3. Dar de beber aos peixes

    metáfora genial
    Bjs tantos

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  4. Boa tarde, tentava abraçar o vento, eu tento e abraço o belo poema.
    AG

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  5. Venho cá nas expectativa de encontrar um novo post...mas voltarei!

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  6. eu era o germe do silêncio

    E com o silêncio comunivavas.

    Felicidades
    MANUEL

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  7. Estou a tentar visitar todos os seguidores do Peregrino E Servo, e verifiquei que eu estava a seguir sem foto, por motivo de uma acção do google, tive de voltar a seguir, com outra foto. Aproveito para deixar um fraterno abraço.
    António Jesus Batalha.

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  8. "Ando cansada do tempo.
    Do tempo que passa"...
    Mas a poeta faz o tempo
    e a coragem.

    Bj, Sónia.

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  9. Um poema que tem dono e destino. Um poema que ficou preso no muro de espelhos, que a metáfora construiu, para que alguém (o poeta que emudeceu uma cidade) não desse de beber aos peixes, que foram morrer nas margens do rio. Há sempre uma tragédia entre o amor e a morte, uma tragédia shakespearena, que se resolve neste belo e excelente poema.

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