14 janeiro, 2014

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Chove. Há nevoeiro. O dia acordou cego.
Na minha rua as pessoas andam de recuas, de costas viradas para o caminho.
Tropeçam, caem e levantam-se, sem nunca tirar os olhos da imagem desfocada
deste dia, que lhes atraiçoa o entendimento: profunda cegueira.
Não se distinguem os passos que dão, mas cada vez estão mais longe uns dos 
outros, separados por mais muros de betão. Colecionam mentiras e desapego, 
as suas únicas verdades. Penduram-nas nas janelas, como se fossem cortinas. 
Não há flores. Está frio. Mais lá dentro do que cá fora. Há cegueira e frieza na 
minha rua. Só os gatos dizem bom dia.  Ainda há pouco um enroscou-se nas 
minhas pernas. Trazia um cartão pendurado ao pescoço que dizia, 
"PROCURAM-SE BORBOLETAS".

Sónia M


Imagem - Silence by Luciane Valença 
(Moleskine - Color Pencil - Graffiti)
https://www.facebook.com/lucianevalencaarts?ref=profile


22 comentários:

  1. Que cheguem borboletas atrás de borboletas, que se cure a cegueira dos que já nem vêm um novo dia.

    Beijinho, gostei muito.

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    1. Para que não sejam só os gatos a fazê-lo - Bom dia alegria!
      Beijo grande :)

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  2. Bom dia Sônia.. tua maneira de escrever é muito fabulosa.. vc enxerga um pouco além e cria cenários com teus dizeres.. bjs e um lindo dia

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    1. Obrigada pela visita e comentário, Samuel.
      Um lindo dia, para ti.

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  3. O Sónia,
    Se a gente escreve qualquer bobeira todos aplaudem: os beijos, os abraços. Só quem já assistiu a morte de alguém que vegetou por dez dias, querendo pedir perdão sem conseguir, não gostam e querem lhe ensinar o que escrever.
    Eu começo ler um texto, se não me apraz eu saio, jamais vou fazer um comentário indelicado, mas a humanidade hoje em dia ninguém entende.
    Desculpe o desabafo
    Adoro tudo que escreve. Você é ótima!
    Beijos
    Lua Singular

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    1. Ontem ouvi alguém dizer (já não me lembro quem)
      "É mais fácil acreditar na hipocrisia do que no genuíno."

      Eu entendi o desabafo, Dorli. Não há nada a desculpar.
      Ser genuíno nos dias de hoje não é fácil. Ninguém é obrigado a gostar de toda a gente, mas existe algo que muitos esquecem, chama-se "Respeito".
      Um beijo grande. Tenha um ótimo dia!

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  4. Infelizmente cada vez mais vivemos de costas voltadas para a vida.
    Ou seja:
    Vegetamos!
    Hermeticamente abitamos numa carapaça de indiferença.
    Pobre daquele que padece de cegueira da alma, e mata a sua vida, à sede de viver!

    JINHO

    http://diogo-mar.blogspot.com/

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    1. Ainda bem que existem os pássaros, os gatos e as borboletas.
      Há dias que são eles que nos lembram que há mais vida na vida. :)

      Beijo

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  5. São perpétuos adeus em catadupta. Uma sonolência que se agudiza.

    Bom dia Sónia M.

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  6. há dias assim, mas, as borboletas virão para alegrar o dia....

    :)

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  7. Infelizmente as pessoas não enxergam outras pessoas a sua volta.
    Me fez lembrar do sindico do prédio, que foi sindico por 30 anos e quando ele morreu, ao perguntar para um senhor no elevador-O senhor viu o síndico do prédio morreu?
    -Síndico que sindico
    Até aonde vai a cegueira do ser humano, ainda bem que o gato do seu poema, e espero que outras pessoas dizem , Bom dia! boa tarde ou boa noite, para qualquer estranho
    Boa noite. Beijos

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  8. Sónia,
    Cultivar flores em pleno frio, eis uma árdua tarefa. Mas, não sei como, há sempre uma(s) que brota(m).

    Beijo :)

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  9. Há caminhantes que falam assim, com voz de silêncio...restam-nos as borboletas e os seus barulhos que ecoam pelas ruas.

    Beijo

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  10. Beijos, nice poem, el portugués es un lindo idioma, escribes fabulosamente.

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  11. Querida amiga

    Hoje,
    mais que ontem,
    vejo com tristeza
    que a nossa busca por sucesso,
    nos condenou também,
    a solidão.

    Desejo aos que amo, não bens materiais,
    mas alegria...
    A mais plena alegria...

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  12. um gato caçando borboletas?

    gato de bom gosto.

    beijo

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  13. Lindo mas tudo tem um ciclo....
    Beijo Lisette

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  14. Muito bom o seu blog,
    por isso vou segui-lo.

    Um beijo.




    .

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  15. Olá Sónia, tudo continua tão frio, tão distante, tão cego!
    E as almas entristecem, fenecem na escuridão imensa que as rodeia. Apenas o gato resiste...
    Beijinhos. Ailime

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  16. O retrato da desordem das coisas e das pessoas!....

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  17. fico a pensar que cenas assim devem receber a qualidade de "desapego"...penso existir um apego a esta morosidade humana...

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