Ao domingo a palavra sobra-me.
Ao domingo a palavra falta-me.
O domingo foi sempre um barco parado,
sem rumo, bem no centro da minha existência.
Um vazio que nasce quando o dia acorda mudo,
sem que nada o preencha ou o afaste.
Ao domingo disfarço o silêncio
com um sorriso oco - que todos devemos sorrir
e ser felizes sempre;
e bonitos; e sábios; e capazes!
E todos são tudo isso e sempre mais.
Agora eu? Eu não gosto do domingo.
A não ser quando a voz da minha mãe
galga a distância, que vai do agora
à hora da missa, ralhando
que vou chegar atrasada. Ouço-a
como se me gritasse de uma das margens.
E eu num barco parado
bem no centro da minha existência.
Não ouço os sinos, nem a reza,
ou o amém, mas distingo o deslumbre
daquela primeiríssima palavra que ouvi ao padre
e corri ao dicionário para saber se existia,
passando a usá-la até à exaustão - blasfémia!
A palavra sobra-me ao domingo.
O domingo é a blasfémia
- não fosse a voz da minha mãe ... - ou
eu sou a blasfémia do domingo.
©Sónia Micaelo
Poema domingueiro lindíssimo de ler.
ResponderEliminar.
Cumprimentos. Um feliz domingo.
.
Pensamentos e Devaneios Poéticos
.
ResponderEliminarAntes que os dedos o afastem
sempre se encontram.
Lâmina sobre a pele fina
E o tempo passa mais lento.
Gosto de ler-te Sónia!
Gosto de ler-te, Sónia!