Ao perceber o quanto vivera iludida, vestiu-se de preto e pouco saía à rua.
Sempre que o fazia, falava com os pássaros, com as nuvens, com as flores
e até com as ervas daninhas. As conversas eram sempre animadas.
Fechou-se no seu desgosto e aí permanecia sem qualquer intenção de lá sair.
Não sofria de desamores. O amor era o único que a mantinha viva.
Amava tudo, tanto...talvez até demais.
O seu desgosto era muito mais profundo e difícil de curar.
Acreditava que ao nascer, trazia as mãos cheias de "coisas", míticas, sábias.
Por isso cerrava os punhos pequeninos, para que nenhuma delas escapasse.
Mas à medida que ia crescendo, as unhas cravavam-se na pele, obrigando-a
a abri-los aos poucos.
E as "coisas" foram-se sumindo, uma a uma, entre os dedos.
Primeiro perdeu a capacidade de só ver o belo do mundo. Começou por notar
o lixo nas ruas, em como um homem todos os dias remexia nesse lixo nauseabundo
e retirava lá de dentro alguma coisa, que levava diretamente à boca.
Todos os dias se cruzava com o mesmo homem, mas nunca antes reparara no
que ele fazia. Isso fez-lhe perder metade do sorriso. A outra metade perdeu-a
quando percebeu que ninguém se importava com aquilo.
Os olhos...serviam apenas para iludir a verdade. Procuram o perfume das
flores e os rostos pintados das meninas bonitas. São incapazes de ver,
as mãos cheias de mentiras, ou como o mundo, lá fora, grita, geme e chora,
pela miséria dos homens e da alma.
Todos os dias, ao fim da tarde, se sentava num banco de jardim para dar comida
aos pássaros. Vendava os olhos e observava como o mundo era nada mais...
que um reflexo de si própria.
Sónia M
(imagem retirada da net)
Só me falta saber se a "desilusão" é o menor múltiplo comum ou o maior divisor comum. De qualquer maneira, ela começa a ser universal.
ResponderEliminarPara além deste, deve existir outro mundo, ouro reflexo, ou até mesmo um mundo onde não existem reflexos.
ResponderEliminarBeijo grande e mais outro, que não consegui comentar à da minha
O mundo é mesmo assim
ResponderEliminarcomo nela própria se reflectia
sentada no banco do jardim
diferente do que antes o imaginaria!
Percebendo quanto vivera iludida
depois de conhecer a vida real
o que escreve, é verdade e não mentira
infelizmente, acontece em Portugal.
Para comer
no lixo procurar
porque o rico muito ter
o pobre para ele trabalhar!
Desejo continuação de boa semana,
para você, amiga Sónia.
Um beijinho do compadre alentejano
E se Deus quiser até à próxima
Por cá se vai andando. Eduardo.
Assim como a Nobreza pertence ao Carácter, também a Beleza é íntima do Íntimo.
ResponderEliminarAs metamorfoses não existem! E mesmo que olhemos de olhos vendados, os reflexos são, sempre, imagem virtual!
ao passar por este espaço, vi o reflexo de um mundo que não se consegue ver a si mesmo. belo mas triste este reflexo.
ResponderEliminarNossa Sónia
ResponderEliminarUm conto de uma realidade contundente, mas muito triste e cheio de criatividade
Você é demais...
Beijos
Lua Singular
Pegando no comentário do Alexandre, eu diria que a desilusão é neste momento o denominador comum a todos os Portugueses.
ResponderEliminarBeijinho, Sonia.
É verdade, Sandra. Isoladamente, cada um de nós, é incapaz de avaliar a extensão do sofrimento humano de milhares de famílias e a devastação social a que o país está a ser sujeito. E ocorre-me agora referir-me à sua cidade natal, a propósito de um testemunho recente de uns cunhados meus, que nela passaram um fim de semana. Aquela rua que sobe até à parte alta da cidade, antes a fervilhar de gente, está agora deserta, com as lojas de comércio praticamente todas encerradas. A restauração foi também devastada pela crise. É o que está a acontecer a todas as cidades e vilas do interior do país, com a desertificação a minar o respetivo tecido social e económico, pondo-se assim em perigo a sua sustentabilidade. E o mais grave é que não se vê um horizonte de esperança para o futuro. Há um objetivo perverso nesta situação, em que a austeridade de alguns países está a servir para o enriquecimento de outros. Foi um prazer, "poeta" Sandra Subtil, vê-la aqui.
EliminarUna historia llena de contundencia y de Realidad. Desgarradora la forma en que se acaba con un Mundo de Ilusiones y Esperanzas en un Mundo lleno de codicia y prepotencias.
ResponderEliminarGran Post.
Um abraço e beijos.
Olá Sónia!
ResponderEliminarBela imaginação, é a triste realidade...A personagem é triste, acho que não tem nada a ver com a autora, que me parece bastante alegre e cheia de humor, bastante afastada da maldita alemã "Alzheimer"!
O meu abraço e um beijo da "Figueira Minha".
Olá!
ResponderEliminarSônia
bem...primeiro penso q vemos o mundo como um reflexo do que somos por dentro. Vemos através de uma lente embaçada por experiências, sentimentos e valores. Vemos o que somos...porém temos que olhar para os seres que habitam a Terra, indo a fundo, de dentro para fora... estendam a mão, mesmo que o início seja duro, seja por nossa desilusão ou falta de compaixão dos outros...
Meu carinho
Boa tarde
Beijos
Sonia,
ResponderEliminartriste, mas realista.
Beijos
Hola bonita, buenas noches,
ResponderEliminarlo triste no debe quitar lo brillante de tu entrada...
te deseo un hermoso miércoles
besos
Um reflexo da vida, beijo Lisette.
ResponderEliminarSonia muito belo e profundo teu conto, desde menina me questiono isso, como alguém pode se dizer feliz neste mundo? Como? Parabéns gostei muito, beijos Luconi
ResponderEliminarSonia querida! Obrigada pelo carinho! Excelente texto! Uma grande reflexão para todos nós! Perdão pela ausência.... Estive afastada do blog por motivos/problemas pessoais e estou retornando esta semana....Tem post novo!
ResponderEliminarUma abençoada semana!
Abraço carinhoso!
Elaine Averbuch Neves
http://elaine-dedentroprafora.blogspot.com.br/
Um lindo texto,
ResponderEliminarA realidade triste deste mundo de hoje nos expõe à sentimentos antes não vividos, se nos envolvemos com tudo o que passa, acabamos por absorver toda a desilusão que o cenário nos mostra. Ao final não saberemos distinguir se somos reflexo para o mundo ou se o próprio mundo se reflete em nós. Parabéns, me fez refletir também.bjs.
Reflexos são invertidos. Para nos vermos como realmente somos, precisamos olhar para o reflexo do reflexo. Precisamos de um segundo espelho, uma segunda alma... um amigo.
ResponderEliminarBeijos, Sónia.
ResponderEliminarQue escrever?
Que é um texto 'reflexo' e que em qualquer lugar, em cada um de nós visualizamos pedaços, sonhos e pesadelos do que fomos ou do que os outros são.
Gostei de aqui vir. E de sentir que há sentido e sentir nas linhas escritas.
Beijo
Laura
(cheguei através do Pena, do JP)
Vi muitos cacos de espelho nesse triste, mas lindo Conto, Sónia.
ResponderEliminarTua sensibilidade posta em palavras é algo comovente.
Doce abraço para você!
Ao ler vi o rosto sonhador
ResponderEliminare alegre da minha mãe...
vi também sua resignação
e teus reflexos em mim.
(já disse que te gosto muito???)
beijo,beijo
obrigada!
Oi querida Amiga!
ResponderEliminarSuas palavras, Reflexo, tristes e profundas,
Podemos olhar para dentro e cada um já passou ou está
passando por semelhantes situações em nossas Vidas!
Tenhas um ótimo dia!
Uma narração muito poética.
ResponderEliminarLinda!
beijinho